segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Minha homenagem a uma mulher mais sensível que uma asa de borboleta!


Charneca em Flor


Enche o meu peito, num encanto mago,

O frêmito das coisas dolorosas...

Sob as urzes queimadas nascem rosas...

Nos meus olhos as lágrimas apago... Anseio!

Asas abertas! O que trago Em mim?

Eu oiço bocas silenciosas

Murmurar-me as palavras misteriosas

Que perturbam meu ser como um afago!

E, nesta febre ansiosa que me invade,

Dispo a minha mortalha, o meu bruel,

E já não sou, Amor, Soror Saudade...

Olhos a arder em êxtases de amor,

Boca a saber a sol, a fruto, a mel:

Sou a charneca rude a abrir em flor!
Se tu viesses ver-me...

Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,

A essa hora dos mágicos cansaços,

Quando a noite de manso se avizinha,

E me prendesses toda nos teus braços...

Quando me lembra: esse sabor que tinha

A tua boca... o eco dos teus passos...

O teu riso de fonte... os teus abraços...

Os teus beijos... a tua mão na minha...

Se tu viesses quando, linda e louca,

Traça as linhas dulcíssimas dum beijo

E é de seda vermelha e canta e ri

E é como um cravo ao sol a minha boca...

Quando os olhos se me cerram de desejo...

E os meus braços se estendem para ti...
Amor que morre O nosso amor morreu...

Quem o diria!Quem o pensara mesmo ao ver-me tonta

,Ceguinha de te ver, sem ver a conta

Do tempo que passava, que fugia!

Bem estava a sentir que ele morria...

E outro clarão, ao longe, já desponta!

Um engano que morre... e logo aponta

A luz doutra miragem fugidia...

Eu bem sei, meu Amor, que pra viver

São precisos amores, pra morrer,

E são precisos sonhos para partir.

E bem sei, meu Amor, que era preciso

Fazer do amor que parte o claro riso

De outro amor impossível que há de vir!


(A poeta imortal Florbela Espanca)


Ela sabia descrever como poucos as Dores e os Amores de toda uma existência vivida em sua plenitude!